SUSPENSÃO E INTERRUPÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

Prof. Ms. HELBERTY COELHO diretoria@hcoelho.com.br 18/05/2020


  1. Introdução

Apesar da literatura jurídica entender que as expressões “suspensão” e “interrupção” do contrato de trabalho não são apropriadas por não conseguir exprimir adequadamente o propósito desses institutos. Deve-se consignar que são justamente essas colocações que a Consolidação das Leis Trabalho (CLT) nos artigos 471 e seguintes utilizam, para assegurar ao trabalhador a manutenção do emprego ainda que cessada, por determinado período, a prestação da atividade ao empregador.

Esses institutos, foram inspirados no Princípio da Continuidade da Relação de Emprego, e tem o intuito de proteger o trabalhador de situações adversas que impeçam a continuidade de seu contrato de trabalho. Aqui, o legislador permitiu a continuidade do emprego, ainda que venham existir algumas anomalias, mesmo que o empregado não esteja prestando serviços.

2. Conceito e características

Apesar da CLT não trazer o conceito desses institutos, coube a literatura jurídica explica-los, trazendo assim seus contornos, características e distinção.

Nesse sentido, o Professor Sérgio Pinto Martins (2017, p. 516) ensina que na suspensão existe a cessação temporária e total da execução e dos efeitos do contrato de trabalho. Logo, o empregador não paga salários, e também não há a contagem do tempo de serviço do empregado que está afastado. Assim, estão suspensos os direitos e as obrigações do trabalhador.

Já na interrupção, há a cessação temporária e parcial dos efeitos do contrato de trabalho, onde há a necessidade do pagamento dos salários no afastamento do trabalhador e, também, existe a contagem do tempo de serviço. Qual seja, apesar do empregado não trabalhar, esse recebe de seu empregador.

Para tanto, observe o quadro comparativo a seguinte que apresente de forma clara as características da suspensão e da interrupção do contrato de trabalho:

Suspensão (art. 476-A da CLT e demais)Interrupção (art. 473 CLT e demais)
Cessação provisória da prestação de serviço.Cessação provisória da prestação de serviço.
O empregador não paga salário;O empregador paga salário;
Não há a contagem do tempo de serviço.Há contagem do tempo de serviço.

Mas, a melhor forma compreender esses institutos é conhece-los de forma ampla, distinguindo caso-a-caso por meio de exemplos práticos, todavia, esses exemplos apesar de estarem relacionados na CLT e em demais legislação, podem ser ampliados segundo a autonomia privada da vontade das partes (empregado e empregador) como entende o artigo 444 da CLT, inclusive nos casos de suspensão, esse pode ser se dar por norma coletiva do trabalho.

3. Suspensão do Contrato de Trabalho

SituaçõesTempo
FériasPeríodo do gozo
GrevePelo tempo que ocorrer a greve
Inquérito para apuração de falta graveDurante o inquérito
Intervalos para alimentação e descanso do trabalhadorNos intervalos de almoço e descanso
Lockout Paralisação das atividades por iniciativa do empregador, que não é permitida no Brasil.Pelo tempo que durar a paralisação
Violência domestica Lei Maria da Penha (Lei 11340/2006), os tribunais superiores entendem que esse período em que a mulher estiver afastada da empresa, cabe ao INSS fazer o pagamento de sua remuneração.Prazo certo fixado pelo juiz
Qualificação profissional Deve estar previsto em Instrumento Coletivo de Trabalho, além de ter o consentimento do empregado.02 a 05 meses
Representação sindical Em caso de acordo com a empresaPelo tempo do acordo
Salário maternidade120 dias
Segurança nacionalPelo tempo necessário
Serviço militar Quando o empregado é incorporado ao serviço militar, nesse caso não será devido ao empregado o salário, mas, seu empregador deverá efetuar o deposito do FGTS. Excepcionalmente será computado o tempo de serviço conforme o artigo 15 da Lei 8.036/1990;Pelo tempo necessário
Suspensão disciplinar. Balão A suspensão do empregado por mais de 30 (trinta) dias consecutivos importa na rescisão injusta do contrato de trabalho. Artigo 474 CLT.Até 30 dias.
Aposentadoria por invalidezEnquanto durar
Empregado eleito para o cargo de diretor Súmula 269 do TST, essa hipótese só não será válida se o empregado eleito a diretor permanecer subordinado a relação de emprego.Enquanto durar
Encargo público Encargo público é diferente de cargo público. São exemplos do encargo público, o empregado que é eleito para exercer o mandato de prefeito, vereador, governador, senador, presidente da república.Enquanto durar o mandato
Calamidade pública em razão do Covid-19 Medida Provisória 936 c/c Ação Direta de Inconstitucionalidade 6363/2020 no Supremo Tribunal Federal Até 60 dias

4. Interrupção

                                    Situações               Tempo
Falecimento do cônjuge. Nojo.02 dias consecutivos
Casamento. Gala. Bodas03 dias consecutivos
Nascimento do filho // para os homens A Licença Paternidade contida no inciso XIX do Artigo 7º da CF/1988 e no § 1º do art. 10 do ADCT é um direito autoaplicável ao pai (gênero masculino), onde se concede o prazo de 05 dias consecutivos ao do nascimento do filho para que possa fazer companhia com sua esposa e assim ajudar a cuidar da criança nos primeiros dias após o parto.   Sérgio Pinto Martins (2018, p.553) entende que a Licença Paternidade é uma hipótese de suspensão do contrato de trabalho, por haver na CLT a interrupção de apenas 01 dia em caso de nascimento do filho para o registro, não importando se o pai é ou não casado.01 dia  
Doação voluntaria de sangue01 dia em cada 12 meses
Alistamento eleitoral02 dias consecutivos
Cumprimento do serviço militarO tempo em que tiver de cumprir
Exames de vestibular p/ensino superiorNos dias em que realizar as provas
Comparecer em juízo (justiça)Pelo tempo que se fizer necessário
Na qualidade de representante de entidade sindical, quando de reunião oficial de organismo internacional do qual o Brasil seja membro (OIT e ONU).Pelo tempo que se fizer necessário
Consultas médicas e exames complementares durante o período de gravidez da esposa ou companheira02 dias
Acompanhar filho de até 06 meses em consulta médica Pode ser aplicado tanto ao homem, quanto a mulher.01 dia por ano
Realizar exames preventivos de câncer03 dias em cada 12 meses
Aborto não criminoso Comprovado por atestado médico oficial. Artigo 39515 dias  
Auxilio Doença e Acidente de Trabalho: 15 primeiros dias § 3º do artigo 60 da Lei 8.213/199115 primeiros dias
Aviso Prévio Duas horas a menos que o empregado sai para procurar emprego02 horas diárias
Faltas ao serviço Previstas em lei, norma coletiva, regulamento da empresa ou próprio contrato de trabalho. Feriados.Dia da falta
Atestados Médicos Será considerada falta abonada a justifica por atestado médico da empresa, de convenio médico firmado pela empresa ou de médico da Previdência Social, exigindo-se essa ordem para validade do referido atestado médico (§ 4º do art. 60 da Lei 8.213/1991 e Súmulas 15 e 282 do TST).Dia abonado pelo médico até 15 dias.
  • 5. Suspensão dos contratos de trabalho pelo estado de Calamidade Pública em razão do COVID 19 (Coronavirus)

Com a instalação da pandemia mundial do Covid-19, também conhecido por Coronavírus, o Brasil em março de 2020 teve que fechar muitos estabelecimentos empresariais de forma compulsória para conter a contaminação do vírus. Tal atitude, era necessária para que o sistema de saúde brasileiro se organizasse internamente e também pudesse adquirir equipamentos básicos no atendimento da população e assim evitar o colapso dos hospitais pelo país a fora.

Assim, com o fechamento das empresas, os empregados que não trabalharam de forma remota, por meio de teletrabalho ou trabalho à distância (home office), num primeiro momento tiveram que ficar sem trabalhar em suas residências, e esses dias faltosos não puderam ser descontados da remuneração desse trabalhador, por entender o § 3º do artigo 3º da Lei 13.979/2020, que essas faltas eram justificadas. Logo, os empregados receberam normalmente sua remuneração.

Sob os protestos dos empresários que tiveram que pagar o salário normal dos empregados, em 01/04/2020 o presidente da República editou a Medida Provisória 936, que permitiu a redução proporcional da jornada de trabalho e salários, além da suspensão temporária do contrato de trabalho, sendo esse último – assunto foco de comentário nesse tópico.

Assim, durante o estado de calamidade pública, o empregador poderá acordar com seus empregados a suspensão temporária do contrato de trabalho, pelo prazo máximo de sessenta dias, que poderá ser fracionado em até dois períodos de trinta dias.

Essa suspensão temporária do contrato de trabalho será pactuada entre empregado e empregador por meio de acordo individual escrito, que será encaminhado ao empregado com antecedência mínima de dois dias. E durante esse período, o empregado, fará jus a todos os benefícios concedidos pelo empregador aos seus empregados; esse empregado ficará autorizado a recolher o seu INSS para o Regime Geral de Previdência Social na qualidade de segurado facultativo.

Essa medida provisória, concede aos empregados uma ajuda mensal do governo federal, que arcará com 100% do valor correspondente ao seguro-desemprego que seria devido ao empregado, considerando seu salário nominal. Esse valor poderá chegar ao máximo de R$ 1.813, 03, caso o empregado receba salário médio acima de R$ 2.666,29.

Para os salários inferiores a esse teto, o cálculo é baseado com premissas diversas, observe:

  • Para os que têm renda mensal inferior a R$ 1.599,61, ele equivale a 80% do salário nominal; e
  • Para os que recebem salário mensal entre R$ 1.599,62 e R$2.666,29, soma-se R$ 1.279,61 a 50% do valor do salário que excede R$ 1.599,62.

A exceção a essa regra são as empresas que possuem receita bruta anual em 2019 acima de R$ 4,8 milhões. Nesse caso, o governo arca com 70% dos valores acima apontados e o empregador deverá pagar 30% do salário do empregado.

Em ato contínuo, o partido político Rede Sustentabilidade propôs uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) de nº 6363 no Supremo Tribunal Federal, pedindo a suspensão dessa medida por entender que essa legislação violava direitos básicos dos trabalhadores. O relator do caso, Ministro Ricardo Lewandowski, em 06/06/2020, em decisão monocrática concedeu em caráter de urgência uma ordem liminar com efeito Erga Omnes, qual seja, que atinge a todos os indivíduos no Brasil que não fora muito bem recebida pela classe empresarial.

Nessa decisão liminar, tanto para a suspensão do contrato de trabalho quanto para a redução da jornada, os empregadores deveriam comunicar o sindicato dos trabalhadores, no prazo de até dez dias corridos, contado da data de sua celebração, para que o sindicato assuma a negociação coletiva, e caso o sindicato não se manifeste no prazo de dez dias, ficaria então caracterizado sua concordância com o transação realizada pelas partes.  

Essa decisão liminar, a princípio, esvaziou os efeitos práticos da Medida Provisória 936/2020, e não foi bem recebida pela classe empresarial, porque transferiu a negociação que era entre empresa e empregados, para empresa e sindicatos. Ocorre que os sindicatos pelo Brasil a fora cobraram taxas sindicais e colocaram algumas imposições para dar o seu aval nessas negociações. Mas, houve sindicatos que de forma antecipada anuíram essas negociações individuais sem imposições de regras, como é o caso do Sindicato dos Comerciários de Foz do Iguaçu e Região (SINECOF) no Estado do Paraná, que entendeu não haver necessidade de sua intervenção e de pronto anuiu todos os acordos por meio de nota em seu sitio eletrônico. 

Mas, dado o clamor social, a Corte se reuniu em Plenário em 17/04/2020 e assim, por maioria de votos, negou provimento a medida cautelar, voltando assim a MP 936/2020 ter seus efeitos legais sem a necessidade da autorização do sindicato, até que seja julgado o mérito da ação.

Por fim, essa liminar poderá ser mantida ou alterada quando o plenário do Supremo Tribunal Federal for julgar esse caso. Por outo lado, para a validade dos elementos dessa Medida Provisória se faz necessário que o Poder Legislativo faça sua aprovação no prazo legal, caso contrário ela perderá sua força normativa. 

6. Efeitos

Por força do artigo 471 da CLT, durante a suspensão ou a interrupção do contrato de trabalhos, os empregados que tiveram que ser afastados por um dos motivos anteriormente apontados, terão direito a todas as vantagens concedidas aos trabalhadores no período em que esteve afastado.

O afastamento do emprego por motivo de serviço militar ou de encargo público não será justificativa para a rescisão do contrato do trabalho, como preconiza o artigo 472 da CLT.

Deve-se deixar claro que é assegurado os trabalhadores o direito à manutenção de plano de saúde ou de assistência médica oferecido pela empresa ao empregado, que tiveram seus contratos suspensos em virtude de auxílio-doença acidentário ou de aposentadoria por invalidez, como reconhece a Súmula 440 do TST.

7. Contratos por tempo determinado

A literatura jurídica entende que em regra geral a suspensão e a interrupção do contrato de trabalho para os empregados regidos nos contrato por tempo determinado, em nada influenciará o término do referido contrato. Pois, os trabalhadores já sabiam quando da contratação o tempo de início e do fim de seus referidos contratos. “Assim, o contrato de trabalho termina exatamente no último dia do prazo combinado” (MARTINS, 2017, p. 550).

Contudo, é importante apontar que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) entende de forma diferente da literatura em diversos casos, em especial, quando se trata de empregada gestante e os trabalhadores que sofreram acidente de trabalho.

Nesse sentido, segundo TST a gestante possui estabilidade desde a concepção até cinco meses após o parto segundo o que dispõem o artigo 10, II, b, do ADCT e o inciso III da Súmula 378 do TST. Da mesma forma, os trabalhadores que sofreram acidente de trabalho também gozam de estabilidade provisória de doze meses nos termos do artigo 118 da Lei 8213/1991 e inciso III da Súmula 378 do TST.

Mais esse assunto e tantos relacionados com a estabilidade do empregado serão melhor estudados em momento oportuno, contudo, é importante ressaltar aqui a controvérsia dessa temática, já que de certa forma esse assunto se relaciona com o assunto desse aula.

8. Dispensa do empregado

Muito se questiona se é possível realizar a dispensa dos trabalhadores que estão com seus contratos de trabalho suspensos ou interrompido. Para responder, deve-se ter em mente que não existe uma lei que proíba a dispensa desses empregados, ainda aqueles que estejam acobertados pelo benefício da Previdência Social.

Como já apontado no tópico anterior, existem certas estabilidades inclusive, os contrato que foram suspensos ou tiveram sua jornada/salários reduzidos à luz da MP 936, possuem estabilidade durante e depois do acordo celebrado, por igual período.

Ademais, em certas situações, e caberá ao empregador que desejar fazer a dispensa desse empregado estáveis, realizar uma indenização dos direitos trabalhistas, o que torna em alguns casos ser inviável essa dispensa devido ao excesso de dinheiro a ser despendido pelo empregador.

Já para os empregados que são dirigente sindicais exige-se a apuração da falta grave para sua dispensa. E para o empregado que é membro da Comissão Interna de Prevenção de Acidente (CIPA) a empresa deve provar para sua dispensa um motivo econômico, financeiro, técnico ou até mesmo disciplinar. Caso contrário, não será possível realizar a dispensa desses trabalhadores devido a sua estabilidade.

Por fim, deve-se pontuar que o mundo jurídico é conflituoso, pois esse é marcado por interesses de diferentes lados. Logo, existem entendimentos de alguns tribunais trabalhistas de que nos contratos suspensos, não se opera a dispensa do trabalhador. Mas, essa situação merece ser analisada especificamente caso a caso em sua concretude.

9. REFERÊNCIAS

______Ação Direta de Inconstitucionalidade 6363. Supremo Tribunal Federal. Disponível em:
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28%28ADI+6363%29%29+NAO+S%2
EPRES%2E&base=baseMonocraticas&url=http://tinyurl.com/ur27m33, acessado em 10/04/2020
______Ação Direta de Inconstitucionalidade 6363. Supremo Tribunal Federal. Disponível em:
http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5886604, acessado em 27/04/2020
_____Medida Provisória 936/2020. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-
2022/2020/Mpv/mpv936.htm, acessado em 10/04/2020
MARTINS. Sérgio Pinto. Comentários à CLT. 21a ed. Saraiva. São Paulo: 2018
MARTINS. Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 33a ed. Saraiva. São Paulo: 2017

ATENÇÃO

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Helberty Coelho

Mestre em Interdisciplinaridade (UNIVALE), Professor nos Cursos de Direito, Ciências Contábeis e Administração (UNIVALE), Advogado atuante nas áreas do Direito Tributário, Empresarial, Trabalho e Bancário, Graduado em Direito pela Universidade Vale do Rio Doce. Contabilista que possui larga experiência profissional nas áreas: Societária, Tributária e IFRS. Atuante nas seguintes temáticas: Direito, Contabilidade, IFRS, Território, Ética, Mercado Econômico, Liberdade e Justiça, com enfoque em Adam Smith e Amartya Sen.

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